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AS PRIMEIRAS HOLDINGS: COMO ROCKEFELLER ORGANIZOU UM IMPÉRIO INVISÍVEL

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    c3digitalandreasiq
  • 21 de mai.
  • 5 min de leitura

AS PRIMEIRAS HOLDINGS: COMO ROCKEFELLER ORGANIZOU UM IMPÉRIO INVISÍVEL

por Piraju Borowski

 

Na semana passada, vimos que a holding não nasceu para proteger famílias — mas para organizar impérios. Hoje, voltaremos ao fim do século XIX para observar como alguns dos maiores conglomerados da história começaram a tomar forma, e como um nome em especial — Rockefeller — transformou uma estrutura jurídica discreta numa arma de dominação econômica.

A holding, nesse contexto, deixava de ser uma abstração legal para se tornar a engrenagem central do capitalismo moderno.

A Inglaterra cria o ambiente, mas não o modelo

Foi no Reino Unido que surgiram as primeiras bases jurídicas para a existência das empresas como entidades separadas de seus sócios. A Companies Act de 1844 foi a primeira legislação britânica a exigir o registro público das sociedades anônimas — marco na formalização da personalidade jurídica. Já a Limited Liability Act de 1855 introduziu o conceito de responsabilidade limitada, permitindo que os sócios respondessem apenas até o valor das ações que subscrevessem, o que protegia seu patrimônio pessoal em caso de falência da empresa.

Essas leis criaram o ambiente jurídico necessário para o surgimento das holdings, ainda que a prática de controle societário centralizado só viesse a se consolidar nos Estados Unidos.

O nascimento da holding moderna: Rockefeller e a Standard Oil

Nos Estados Unidos, o espírito empresarial encontrou nas novas estruturas societárias uma aliada poderosa. John D. Rockefeller, dono da refinaria de petróleo Standard Oil, entendeu que poderia usar uma entidade jurídica para centralizar o comando de dezenas de empresas — mesmo sem ser proprietário direto de cada uma.

Em 1882, foi criada a Standard Oil Trust, considerada a primeira grande holding moderna. Com ela, Rockefeller reuniu sob um único guarda-chuva jurídico mais de 40 empresas do setor de petróleo em uma estrutura que permitia expansão rápida e proteção contra riscos setoriais, com controle centralizado mesmo com capital distribuído entre diversas empresas.

De onde vem a palavra holding?

A palavra holding vem do verbo inglês to hold, que significa manter, reter ou possuir. Está relacionada ao termo shareholder, formado por share (ação) e holder (portador), que pode ser traduzido literalmente como “portador de ações” — ou, no português técnico, acionista. Assim, uma holding é, em essência, uma empresa que detém ações ou quotas de outras sociedades. Convém destacar que nem toda holding exerce controle: basta que ela detenha participação societária. Já a controladora é aquela que possui poder de decisão, seja por maioria acionária, por acordos de acionistas ou por estruturas diferenciadas de capital — como categorias de ações com poder de voto exclusivo.

Esse controle nem sempre é proporcional ao capital social. Há diferentes categorias de ações, como ordinárias (com direito a voto), preferenciais (com prioridade em dividendos, geralmente sem voto), nominativas (registradas em nome do titular) e, historicamente, ao portador (proibidas no Brasil desde 1990).Em estruturas mais sofisticadas, o controle pode ser assegurado por mecanismos como a golden share — uma ação especial que confere poder de veto ou decisão estratégica a seu titular, mesmo que ele detenha uma fração mínima do capital. No Brasil, a golden share foi usada nas privatizações da Vale e da Embraer.

Embora muito conhecida por seu uso pelo Estado em empresas estratégicas, a golden share também é utilizada no setor privado. No Brasil, Abílio Diniz recorreu a esse mecanismo para preservar seu poder decisório no Grupo Pão de Açúcar mesmo após a entrada de investidores estrangeiros.

O império cresce... e incomoda

O modelo da Standard Oil era tão eficiente que se tornou dominante. Em menos de vinte anos, a empresa controlava cerca de 90% do refino de petróleo dos EUA. Não é difícil perceber que o modelo implementado pelos Rockefeller gerou concentração demais e concorrência de menos.

O Congresso americano aprovou a Sherman Antitrust Act de 1890 e, em 1911, a Suprema Corte dos EUA ordenou o desmembramento da Standard Oil em 34 novas empresas — muitas das quais existem até hoje, sob novas identidades e com atuação global. Entre as mais notáveis:

  • ExxonMobil: fruto da fusão entre a Standard Oil of New Jersey (Esso) e a Standard Oil of New York (Socony), consolidada em 1999.

  • Chevron: originada da Standard Oil of California (SoCal), que também adquiriu a Standard Oil of Kentucky (Kyso).

  • Mobil: antes da fusão com a Exxon, operava como Socony-Vacuum, descendente direta da Standard Oil.

  • Amoco: anteriormente Standard Oil of Indiana, posteriormente fundida à British Petroleum.

  • BP (British Petroleum): além da Amoco, incorporou a Standard Oil of Ohio (Sohio), fortalecendo sua presença nos EUA.

  • Marathon Petroleum: descendente da The Ohio Oil Company, renomeada como Marathon Oil em 1962 e, mais tarde, dividida em duas companhias.

  • ConocoPhillips: embora não diretamente uma das 34, herdou ativos de várias empresas ex-Standard, incluindo a Continental Oil Company, adquirida pela Standard Oil em 1884.

Essas empresas — ou seus sucessores — ainda hoje desempenham papéis centrais no setor energético global, refletindo o legado duradouro da estrutura concebida por Rockefeller.

Conclusão

A holding nasceu no ambiente da indústria pesada e da competição empresarial intensa. Serviu para expandir, dominar, reorganizar e — com o tempo — proteger. Mas a proteção que oferecia ainda era corporativa, não patrimonial.

Na próxima semana, saltaremos ao século XX e veremos como foi a chegada da holding ao Brasil.

Sobre o autor

Piraju Borowski Mendes é sócio fundador da PBCA Planejamento, que tem a missão de elevar a conscientização e a prática do planejamento patrimonial entre as famílias brasileiras. Coronel da reserva do Exército Brasileiro e membro do Time Holding Brasil, exerce a atividade de consultoria aplicada ao planejamento patrimonial das famílias. É Doutor em Ciências Militares, por notório saber; Especialista em Direito Imobiliário Extrajudicial e Especializando em Direito de Família e Sucessões Extrajudicial. Dedica-se ao estudo e elaboração de holdings familiares desde 2021, seguindo a metodologia de planejamento patrimonial que emprega como ferramenta o sistema de holding familiar.

 

Referências

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